REVIEW: Matheus & Kauan – Na Praia

REVIEW: Matheus & Kauan – Na Praia

Eis aqui um caso curioso na música sertaneja. É um dos únicos episódios que já vi em que um disco despretensioso, de coletânea, com apenas 4 canções inéditas, acaba sendo o mais importante trabalho da carreira de uma dupla, a ponto de colocá-los enfim num patamar que há tempos já lhes era devido, mas que, talvez pela sofisticação costumeira dos trabalhos anteriores, não tinha encontrado ainda a chancela definitiva do público. Pelo menos até agora.

Matheus & Kauan sempre foram acima da média. Sempre escrevi as melhores resenhas possíveis sobre os discos da dupla. Simplesmente porque são, de fato, muito bons. “Mundo Paralelo” é um DVD com uma absurda qualidade de arranjos e que celebra o melhor da dupla também no campo da composição, fora as grandes participações de peso que fizeram parte do projeto. “Face a Face” valoriza ainda mais a dupla no quesito “sofisticação”, com direito a um repertório mais culto e a participação de uma orquestra de cordas, o que engrandece qualquer trabalho.

O que faltava, portanto, a Matheus & Kauan? Confesso que sempre me fiz essa pergunta. A dupla já reunia os principais quesitos necessários para figurar entre os maiores nomes do mercado. Excelente repertório, excelentes produções e o maior escritório do Brasil dando todo o suporte. Talvez a resposta mais lógica fosse mesmo a mais simples: a falta de um apelo mais popular.

Não que a dupla não fosse comercial. Mas é que, até então, as músicas mais conhecidas e queridas da dupla carregavam uma qualidade que, aparentemente, passavam do tal ponto de aceitação daquela parcela média do público, acostumada com músicas de menor qualidade. Eles até emplacaram algumas releituras de hits do nordeste, mas, talvez por não serem músicas originais da dupla, ainda não eram elas as músicas que catapultar-lhes-iam (eita!) ao lugar no mercado que eles mereciam.

Manter, portanto, a sofisticação, mas encontrar enfim um caminho menos complicado para que o público pudesse abraçar de vez a dupla parecia ser a meta a ser batida. Para isso, uma decisão que deixou muitos de orelha em pé: gravar um DVD poucos meses depois de gravar e lançar o anterior. Ainda mais um projeto com uma evidente e enorme qualidade de repertório, como era o “Face a Face”. E sem nenhum alarde. A dupla gravou às margens do lago Paranoá, em Brasília, sem todo aquele esquema de convidados, naturais em qualquer DVD Audiomix, com uma estrutura simples e a própria banda da dupla.

Só que desta vez a dupla gravou um DVD que, de fato, os aproximava mais do público. Ambiente sunset, barcos ao fundo, público jovem e descolado, enfim, todo aquele clima elitizado que o público playboy adora e com qual o público popularesco adora sonhar. E no repertório as melhores canções do DVD “Face a Face” e algumas do “Mundo Paralelo”. Enfim, um resumo do que de melhor a dupla havia lançado até então no que diz respeito à música.

Mas é no ingrediente surpresa que reside o grande diferencial deste disco com relação aos anteriores: as canções inéditas. O carro-chefe, “O nosso santo bateu”, conseguiu finalmente misturar a sofisticação natural da dupla com um aspecto mais popular. Uma música com a cara do povo brasileiro e que, de quebra, foge do lugar comum de 98% das músicas lançadas no gênero sertanejo. Pra começar, a música não é nem vaneira e nem bachata, mas sim um reggae, com a sacada de usar nos arranjos um trio de metais, sem perder a essência sertaneja. E a letra traz tudo o que a dupla sempre valorizou: qualidade, e com um refrão que gruda na mente. A composição é do próprio Matheus e do Pacheco, dois dos compositores mais badalados dos últimos tempos.

“O nosso santo bateu” ainda abriu os olhos da dupla pra um outro aspecto que acabou se mostrando muito mais favorável e, por que não dizer, barato. O arranjo é do próprio Matheus e do Daniel Silveira, que desde sua saída da banda do Gusttavo Lima trabalha com a dupla Matheus & Kauan. Vejo o Daniel como um dos talentos mais subestimados do nosso mercado sertanejo. Até já insisti com ele diversas vezes para ele começar a produzir mais, já que, só pra citar dois exemplos, é dele a produção do melhor disco da carreira do Gusttavo Lima, “Do outro lado da moeda”, e do melhor disco da carreira do Eduardo Costa, “De Pele, Alma e Coração”. E se o cara está na banda, é óbvio que ele tem que ser aproveitado também na produção e nos arranjos.

A música fez (e ainda faz) tanto sucesso que enfim abriu os olhos do público para o quão boa é a dupla Matheus & Kauan. Em pouco tempo, ela começou enfim a figurar entre os maiores nomes da atualidade, com uma das agendas mais concorridas do sertanejo e um dos melhores retornos de público. E agora com um hit a tiracolo, sem o problema de não ter nada mais a mostrar no show, afinal o público já era familiarizado com o repertório da dupla. A música de virada, “Decide aí”, apesar de não ter o mesmo aspecto inovador de “O nosso santo bateu”, continua trazendo a dupla um pouco mais para os braços do público com uma linguagem mais simples na sonoridade, mas ainda com uma letra inteligente.

Deixar as coisas dentro de casa (tanto a composição quanto a produção e até os músicos que gravam) acabou sendo, portanto, uma das decisões mais inteligentes possíveis. Tanto que a dupla manteve a mesmíssima estrutura no DVD, “Na Praia 2”, gravado recentemente e com algumas músicas já disponíveis no Youtube. E o “Na Praia” mostrou ainda que não é preciso muita coisa para conseguir trazer o público para si. Por mais sofisticada que a dupla seja (e que continue assim), foi quando ela resolveu ser, também, um pouco mais popular que o caminho finalmente se abriu e a dupla subiu enfim os degraus do sucesso que faltavam e que ela sem dúvida alguma merecia.